João de Deus Girão
Se tivesse nascido na antiga Roma, João de Deus seria, com certeza, um centurião romano, um oficial superior, um autêntico guerreiro, preparado para a batalha. Alto, fisicamente bem dotado, com as insígnias e as armas do trabalho e da dignidade, pertencia ao exercito dos soldados que lutam para conquistar as inexpugnáveis fortalezas da inércia, do pessimismo e da falta de iniciativa. Era assim João de Deus.
Nascera para comandar um exército de cidadãos. Sua voz de comando era seguida à risca; suas idéias encontravam receptividade no seio de sua comunidade. Líder autêntico foi bastante feliz para trazer a vitória a todos os seus empreendimentos.
Seu primeiro triunfo ocorreu na aplicação da moderna agricultura, iniciando o cultivo mecânico das terras, com o uso, pela primeira vez, em Morada Nova, do arado trazido de Quixadá, em 1929. Essa nova técnica generalizou-se por todo o município, graças aos 95 bois que João de Deus possuía e os emprestavam a pequenos proprietários, para facilitar-lhes o cultivo de suas terras.
Do pioneirismo da agricultura, este extraordinário moradanovense passou à modernização da pecuária bovina e leiteira, além de incentivar a criação da raça de ovelha “Morada Nova”, hoje considerada a melhor do mundo, conquistando, em 1945, na Exposição da Secretaria de Agricultura do Ceará, o primeiro lugar, com um reprodutor desta raça. Antes, mais precisamente, em meados de 1943, enquanto cuidava da melhoria dos rebanhos, tornou-se sócio-fundador da Associação dos Vaqueiros e Criadores de sua terra, resgatando, assim, o prestígio do vaqueiro campeador. De forma decisiva, colaborou com a tradição da “derrubada” nas vaquejadas de Morada Nova, que tão alto eleva o nome daquele município.
Como vereador, em 1962, lutou para que o pequeno proprietário adquirisse suas terras dentro das condições impostas pela COLON (Carteira de Colonização), apesar da oposição do prefeito, que também se opôs as suas idéias para a modernização e embelezamento da Lagoa da Salina.
Comprando grandes propriedades para sub-dividí-las com pequenos proprietários, João de Deus fixou mais de 100 colonos, praticando uma espécie de reforma agrária antecipada.
O transporte coletivo também teve nesse ilustre representante da família Girão o seu precursor. Todos se lembram do caminhão-misto de três boléias, que, por 16 anos, fazia a linha Morada Nova – Fortaleza, via Russas e Quixadá. Este meio de condução, além de transportar os passageiros e suas bagagens, deixava cada um em sua própria residência.
João de Deus nunca deixou de ser político. Fundador do MDB, hoje PMDB, em Morada Noa, chegou a ser eleito vereador em quatro legislaturas, sempre entre os primeiros mais votados. Como sói acontecer com todo grande homem, João de Deus sempre contou com sua extraordinária mulher: Ana, sua prima legítima. Disposta a lutar em companhia do futuro marido, em difícil situação financeira, a jovem noiva respondeu ao Juiz que lhe perguntara o que ela esperava herdar dele: – Nem que sejam as suas dívidas! A partir daquela pergunta grosseira com resposta pronta e na hora, Ana foi sempre um exemplo de dedicação e trabalho ao lado de seu esposo. Especializou-se ela no fabrico de queijo, o conhecido e delicioso “Queijo da Ana”, graças ao qual o casal saiu da delicada situação financeira em que se encontrava.
Vencidas as dificuldades econômicas, superando até mesmo as ingratidões de que tinha sido alvo, esse invencível membro da nossa família, com os seus filhos: José Eni, João de Deus Filho e Durval, juntos fundaram a empresa Agropecuária Vale do Banabuiú Ltda. (AGROVAL).
Este incansável comandante nunca deixou de emprestar toda sua força e experiência para aconselhar e incentivar seus semelhantes, para que eles nunca se detenham nas adversidades que a vida eventualmente lhes apresenta, vencidos pelas dificuldades, paralisados pela inércia, batidos pela desesperança e pelo insucesso.
João de Deus Girão, em companhia de sua idolatrada esposa – uma união que durou mais de 60 anos “e muito bem vividos” – tornou-se um homem verdadeiramente realizado.
Com oito filhos, todos saudáveis e bem sucedidos, cuidou com aprumo e desvelo de suas boas fazendas em sua terra natal, gozando de muita saúde e excelente situação financeira, mercê de Deus e de seu profícuo trabalho. Uma única coisa que verdadeiramente lamenta, de maneira profunda – e provavelmente “com lágrimas rolando pelo coração” – foi a morte prematura de sua filha Dilce, ocorrida em 1987 e que foi para o céu, deixando, a fim de compensar esta perda irreparável e dolorosa, a lembrança de sua única filha Lucile, enlevo e benquerença de seus avós.
Eis o homem João de Deus Girão, um soldado que pelejou com as armas da coragem invencível, da iniciativa indômita e da persistência objetiva, levando o progresso para sua terra e melhoria de vida para sua gente.
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